Quando se pensa
nesse incrível músico, a primeira lembrança é a primeira fase de sua carreira,
quando flertava ainda com a bossa nova. Esse período, mais vivo até 1966,
remonta belas canções como "Preciso aprender a ser só" e "Samba
de Avião", que fizeram de Marcos Valle uma peça importante no cenário
nacional. As transformações começariam no ano seguinte com a introdução de
gêneros regionais nas faixas. A parceria com os futuros integrantes do Azymuth
a partir de 1969 mudariam de vez sua carreira, o levando para os cenários menos
explorados da música popular. Após alguns trabalhos juntos, surgiria no ano de
1973 um de seus registros memoráveis após a fase bossa, era o eclético e
provocante "Previsão do Tempo".
Essa grande obra
começaria pela capa, que mostra um close de Marcos Valle dentro de uma piscina
dando a crer que estivesse morto, dando brecha para várias interpretações, como
a idéia do receio em relação à determinação do regime ditatorial brasileiro em
impedir certas manifestações artísticas. A participação de José Roberto Bertrami
(órgão e sintetizadores), Alex Malheiros no baixo e Ivan Conti na
bateria foram um dos fatores determinantes para o resultado final do álbum,
dada a sonoridade diferenciada que foi posta no álbum, como o baixo Rickenbacker
4001 e o mini moog de Zé Bertrami. A produção ficaria por Milton Miranda,
auxiliado na coprodução pelo irmão de Marcos Valle, Paulo Sérgio Valle, que
também assina várias faixas com o irmão.
O abre-alas do
álbum é "Flamengo até Morrer", um sambinha com grande uso da cuíca e
dos coros, que fala em sua letra da paixão da gigante torcida flamenguista com
seu time (que o faz comer um prato a menos de comida para comprar os ingressos),
citando desde ele até o presidente Médici como "flamenguistas até morrer".
A resolução de problemas na equipe, em "parece que finalmente resolvemos o
dilema, Dario e Dorval jogando juntos sem problemas", além de escalar a
equipe em outros versos. A surpresa fica com o solo de guitarra que se dá no
final da música. O samba é tão bom que faz até o vascaíno que vos escreve ouvir
sem nenhum tormento. A sequência se dá com a faixa "Nem Paletó Nem
Gravata", uma faixa bastante funkeada com o baixo de Alex Malheiros e o
mini moog como protagonistas, sintonizando a letra ao antigo lema brasileiro de
comodidade, um verdadeiro canto contra os padrões de formalidade da sociedade
setentista. "Tira a Mão" seria um samba cheio de teclas falando dos
falsos colegas. "Mentira", a quarta faixa do álbum, tem em suas
teclas uma lembrança muito viva do estilo do pianista Sérgio Mendes, um samba
não tão tradicional quanto à primeira música, e sim com variações psicodélicas,
com extenso recurso dos teclados. Uma curiosidade é notar uma possível
"Human Beatbox" que Valle reproduz na faixa, sem dúvida um
pioneirismo para a época. Após a instrumental "Previsão do Tempo",
única música composta unicamente por Marcos Valle, a música que segue (Mais que
uma Valsa) é bem conduzida por um baixo marcando tempo, com cordas e teclas
intercalando-se. O vocal nessa faixa beira ainda a técnica do falsete,
evidenciando a capacidade do músico. faixa beira ainda a técnica do falsete, evidenciando a capacidade do músico. O baião "Os Ossos do Barão", que é também música de abertura de novela global do mesmo ano é a faixa com mais pegada regional de todo álbum, e fala em sua letra dos artifícios utilizados por um empregado que cria riquezas durante a Revolução Industrial paulistana (que tem em posse todos os bens do barão, inclusive seus ossos) e que pelo fato de não ser nobre, indaga o valor da vida e do sorriso das pessoas, sondando-as com dinheiro que compraria até "o mundo inteiro". O trio de compositores Marcos Valle, Eumir Deodato e João Donato
assinam duas músicas: "Não Tem Nada Não", com sua pitada de samba com
rock e "Não Tem Nada Não pt 2", uma continuação do instrumental.
"Samba Fatal" possui um poderoso sintetizador que dá atmosfera bem
cinzenta para descrever as atitudes na vida de uma pessoa, como "Amanheceu
entre estudar ou calar, fumar ou lutar, sonhar ou falar, cantar ou gritar".
"Tiu-Ba-La-Quieba" seriam as frases que um indivíduo mal da cuca
começou a falar, possui uma melodia que lembra em alguma coisa o reggae,
promovido grande parte disso à bateria de Ivan Conti e as teclas de Zé Roberto,
a faixa ainda marca a técnica de falsete no refrão. A música que fecha o álbum
é a bossa "De Repente Moça Flor", com um vocal suave de Valle
acompanhado pelo trio de músicos do Azymuth, que surpreenderiam ao final da
música com uma sonoridade progressiva, pelo solo das teclas.
As composições, em
maioria da parceria dos irmãos Paulo Sérgio e Marcos compõem um álbum que
estava muito a frente do seu tempo, não tendo paralelos na década mais rica da
nossa música. Valle confirmou de vez seu talento como músico, a ponto de
explorar-se tanto nas harmonias e técnicas vocais, quanto em faixas mais
dispersas, como o baião da faixa sete, o funk e samba em tantas outras e
resquícios de bossa nova, que fecham a obra. Outro destaque são as letras, que
abordam temas corriqueiros na sociedade brasileira, como o futebol, a
indisposição aos paradigmas do trabalho e o valor do dinheiro, contra a
condição moral dos indivíduos, dos que se vendem por alguma coisa, ou os que
oferecem para obter algo. "Previsão do Tempo" é ideal para todo
aquele que se interesse pelo suprassumo da música brasileira, um trabalho
aclamado à nível mundial que infelizmente é muito pouco conhecido em sua terra
natal.
Gravadora: | Odeon |
Lançamento: | 1973 |
Gênero: | Funk, Samba e Psicodélico |
A1) Flamengo
Até Morrer | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 3:26 |
A2) Nem
Paletó Nem Gravata | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 2:57 |
A3) Tira
A Mão | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 2:44 |
A4) Mentira | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 3:41 |
A5) Previsão
do Tempo |
Compositore:
Marcos Valle | 3:33 |
A6) Mais
Do Que Uma Valsa | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 2:47 |
B1) Os
Ossos do Barão | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 2:15 |
B2) Nao
Tem Nada Não | Compositores:
Eumir Deodato, João Donato e Marcos Valle | 3:08 |
B3) Nao
Tem Nada Não pt 2 | Compositores:
Eumir Deodato, João Donato e Marcos Valle
| 1:20 |
B4) Samba
Fatal | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 3:04 |
B5) Tiu-Ba-La-Quieba | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 3:21 |
B6) De
Repente Moça Flor | Compositores:
Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle
| 3:03 |
Vocais: | Marcos
Valle |
Vocais de Apoio: | Marcos
Valle |
Baixo: |
Alex Malheiros
|
Guitarra: |
Sérgio Hinds
|
Órgão e Sintetizadores: |
José Roberto Bertrami
|
Piano Elétrico: | Marcos
Valle |
Bateria: | Ivan
Conti |
Arranjo: |
José Roberto Bertrami(2,3,4,5,6,8,9,11,12), Marcos Valle(1,10) e Waltel
Branco(7)
|
Produção | Milton
Miranda |
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